Data

Agora que o pior acontecera, eu deixava de ter de continuar a viver no medo de ver o pior acontecer. É assim que a razão, abalada, formula a sua lógica ferida. (John Banville, Eclipse)

 

26 agosto 2006

Frases Iniciais Exemplares – Lista Alternativa (blogosfera)

#48 – David Lodge, A vida em surdina

«O indivíduo de óculos, alto e grisalho, que se encontra parado na orla da multidão, na sala principal da galeria, com o tronco inclinado para a frente e quase em cima da rapariga de blusa de seda vermelha, com a cabeça baixa e de lado, a fazer que sim de semblante compenetrado e a soltar um murmúrio fático de vez em quando, não é, como poderão pensar, um padre em dia de folga que a jovem convenceu a ouvi-la em confissão a meio da festa, nem um psiquiatra que ela ludibriou para conseguir uma consulta à borla; convém explicar que ele também não assumiu aquela postura para espreitar melhor para dentro da blusa dela, embora esse seja um bónus inesperado da situação – o único, diga-se de passagem.»

(Asa, 1.ª edição, Maio de 2009, pág. 9; tradução de Tânia Ganho; obra original: Deaf Sentence, 2008)


#47 – Samuel Beckett, Malone está a morrer

«Dentro em breve estarei apesar de tudo bem morto finalmente. Talvez para o mês que vem. Será então o mês de Abril ou de Maio. Porque o ano vai pouco adiantado, mil pequenos indícios mo dizem. Pode ser que me engane e que passe ainda o São João ou até o 14 de julho, festa da liberdade.»

(Dom Quixote, 2.ª edição, Maio de 2003, pág. 7; Tradução de Miguel Serras Pereira; Obra Original: Malone Meurt, 1951))


#46 – 22 de Setembro de 2006 – José Saramago, As Intermitências da Morte

«No dia seguinte ninguém morreu.»

(Caminho, Outubro de 2005, pág. 13)


#45 – 10 de Setembro de 2006 – Hans Blumenberg, Naufrágio com espectador (ensaio)

«O homem conduz a sua vida e ergue as suas instituições sobre terra firme. Todavia, procura compreender o curso da sua existência na sua totalidade, de preferência, com a metáfora da navegação temerária.»

(Vega, 1990, pág. ?; Tradução de Manuel Loureiro; Obra Original: Schiffbruch mit Zuschauer, 1979)

Contribuição de Luís Carmelo, Miniscente.


#44 – 10 de Setembro de 2006 – Miguel de Cervantes, O Engenhoso Fidalgo D. Quixote de la Mancha (Prólogo da obra)

«Desocupado lector:

«sin juramento me podrás creer que quisiera que este libro, como hijo del entendimiento, fuera el más hermoso, el más gallardo y más discreto que pudiera imaginarse. Pero no he podido yo contravenir al orden de naturaleza, que en ella cada cosa engendra su semejante.»

Em português:

«Desocupado leitor, sem juramento me poderás crer que quisera que este livro, como filho do entendimento, fora o mais formoso, o mais galhardo e o mais discreto que pudera imaginar-se. Mas eu não pude contravir a ordem da natureza, na qual cada coisa engendra a sua semelhante.»

(Civilização, 1999, Vol. I, pág. 20; Tradução de Daniel Augusto Gonçalves e Arsénio Mota; Obra Original: El ingenioso hidalgo Don Quixote de la Mancha, 1605; Título posterior: Don Quijote de la Mancha)

Contribuição de Rogério, Conto as favas.


#43 – 10 de Setembro de 2006 – Ruth Rendell, Sentença em Pedra

«Eunice Parchman matou a família Coverdale porque não sabia ler nem escrever.»

(Gradiva, 1.ª edição, 1984, pág. ?; Tradução de Adélia Silva Melo e revisão de Manuel Joaquim Vieira; Obra Original: A Judgement in Stone, 1977)

Contribuição de Abel Sequeira Ferreira, The Red Notebook.


#42 – 10 de Setembro de 2006 – Juan Rulfo, “Deram-nos a terra”, Planície em chamas (contos)

«Depois de tantas horas de caminhar sem encontrar nem uma sombra de árvore, nem uma semente de árvore, nem uma raiz de nada, ouve-se o ladrar dos cães.»

(Cavalo de Ferro 2003, pág.11; Tradução de Ana Santos; Obra Original: “Nos han dado la tierra” in El llano en llamas, 1953)

Contribuição de Filinto Melo, Jornada.


#41 – 10 de Setembro de 2006 – William S. Burroughs, Festim Nu

«Acordei da doença aos quarenta e cinco anos, calmo, são de espírito e, excepto o fígado debilitado e a aparência de estar metido na pele de um outro que é comum a todos aqueles que sobreviveram, razoavelmente saudável. A doença… a maior parte dos doentes não se lembra do delírio em pormenor.»

(Editorial Notícias, 1.ª edição, Outubro de 2002, pág. 9; Tradução de José Luís Luna e revisão de Abel Gomes; Obra Original: Naked Lunch, 1959)

Contribuição de Henrique Fialho, Insónia.


#40 – 26 de Agosto de 2006 – Albert Camus, O Mito de Sísifo (ensaio)

«Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia.»

(Livros do Brasil, 1.ª edição, Setembro de 2005, pág. 15; Tradução de Urbano Tavares Rodrigues; Obra Original: Le mythe de Sisyphe, 1942)

Contribuição de Sérgio Lavos, Auto-Retrato.


#39 – 26 de Agosto de 2006 – Jerónimo Bemposto, Terras altas

«De avô a bisneto, os Gastões conquistaram toda a Azinheira e passaram para lá do rio, para depois perderem até o que não tinham. Foi só então que se soube que mesmo o nome era usurpado: eram Oliveira, de origens obscuras e misturadas, nascidos decerto em desterro e temperados pela maldição.»

(1969, sem mais referências)

Contribuição de Luís Mourão, Manchas.


#38 – 26 de Agosto de 2006 – John Steinbeck, Bairro de Lata

«Cannery Row, em Monterey, na Califórnia, é um poema, um fedor, uma estridência, uma gradação de luz, um som, um vício, uma nostalgia, um sonho.»

(Verbo, 1972, pág. ?; Tradução de Luísa Maria de Eça Leal; Obra Original: Cannery Row, 1945)

Contribuição de Mónica Granja, Linha do Norte.


#37 – 26 de Agosto de 2006 – Agustina Bessa-Luís, Jóia de Família

«Não se escreve melhor porque se escreveu muito. Às vezes, vou surpreender nas páginas antigas assinadas pelo meu punho um tom perfeito em que a imaginação ronda como uma madrinha incapaz de envelhecer e de perder a razão. A razão é a mesma, a coberto das longas provações das decepções, da experiência, de tudo.»

(Guimarães, 5.ª edição, Novembro de 2002, p. 7)

Contribuição de uma Leitora devidamente identificada.


#36 – 26 de Agosto de 2006 – Peter Handke, A angústia do guarda-redes antes do penalty

«Quando o canalizador Joseph Bloch, que tinha sido um conhecido guarda-redes, se apresentou ao trabalho uma manhã, soube que fora despedido.»

(Relógio D’Água, 1987, pág. 9; Tradução de Maria Adélia Silva Melo; Obra Original: Die Angst des Tormanns beim Elfmeter, 1970)

Contribuição de Pedro Vieira, irmaolucia.


#35 – 26 de Agosto de 2006 – Mário de Carvalho, Fantasia para Dois Coronéis e Uma Piscina

«Assola o país uma pulsão coloquial que põe toda a gente em estado frenético de tagarelice, numa multiplicação ansiosa de duos, trios, ensembles, coros.»

(Caminho, 1.ª edição, Novembro de 2003, pág. ?)

Contribuição de Henrique Fialho, Insónia.


#34 – 23 de Agosto de 2006 – Yann Martel, A Vida de Pi

«O meu sofrimento deixou-me triste e desanimado.»

(Difel, 7.ª edição, Setembro de 2005, pág. 19; Tradução de António Pescada; Obra Original: Life of Pi, 2002)


#33 – 23 de Agosto de 2006 – Thomas Mann, Doutor Fausto

«Faço questão de assegurar com toda a clareza que não tenho qualquer intenção de colocar a minha pessoa num lugar de destaque, ao escrever algumas palavras acerca de mim mesmo e das minhas próprias actividades, antes de iniciar o relato da vida do finado Adrian Leverkühn, a primeira e certamente muito provisória biografia do saudoso homem e músico genial, que o destino tão terrivelmente assolou, engrandecendo-o e derribando-o.»

(Dom Quixote, 2.ª edição, Março de 1999, pág. 9; Tradução de Herbet Caro, com revisão para Portugal por José Jacinto da Silva Pereira; Obra Original: Doktor Faustus, 1947)


#32 – 23 de Agosto de 2006 – Don DeLillo, Mao II

«Aí vêm eles, marchando para a luz do sol americano.»

(Relógio D’Água, Junho de 2004, pág. 11; Tradução de José Miguel Silva; Obra Original: Mao II, 1991)


#31 – 23 de Agosto de 2006 – Camilo José Cela, La Familia de Pascual Duarte

«Yo, señor, no soy malo, aunque no me faltarían motivos para serlo. Los mismos cueros tenemos todos los mortales al nacer y sin embargo, cuando vamos creciendo, el destino se complace en variarnos como si fuésemos de cera y en destinarnos por sendas diferentes al mismo fin: la muerte. Hay hombres a quienes se les ordena marchar por el camino de las flores, y hombres a quienes se les manda tirar por el camino de los cardos y de las chumberas.»

(Espanha: Ediciones Destino, 19ª Edición, 1989, pág. ?)

Contribuição de Manuel A. Domingos, Versões.


#30 – 23 de Agosto de 2006 – Eça de Queiroz, A cidade e as Serras

«O meu amigo Jacinto nasceu num palácio, com cento e nove contos de renda em terras de semeadura, de vinhedo, de cortiça e de olival.»

(Livros do Brasil, 1981, pág. ?; Publicado originalmente em 1901 – publicação póstuma)

Contribuição de Luís Miguel Oliveira, As Aranhas.


#29 – 23 de Agosto de 2006 – Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser

«O eterno retorno é uma ideia misteriosa de Nietzsche que, com ela, conseguiu dificultar a vida a não poucos filósofos: pensar que, um dia, tudo o que se viveu se há-de repetir outra vez e que essa repetição se há-de repetir ainda uma e outra vez, até ao infinito!»

(Dom Quixote, 26.ª edição, Junho de 2004, pág. 1; Tradução de Joana Varela; Obra Original: Nesnesitelná lehkost byti, 1984)

Contribuição de Mónica Granja, Linha do Norte.


#28 – 23 de Agosto de 2006 – Jean-Paul Sartre, A Náusea

«O melhor seria escrever os acontecimentos dia a dia.»

(Europa-América, 1976, pág. 7; Tradução de António Coimbra Martins; Obra Original: La nausée, 1938)

Contribuição de Henrique Fialho, Insónia.


#27 – 21 de Agosto de 2006 – Truman Capote, A sangue-frio

«A aldeia de Holcomb fica situada no meio dos planaltos de trigo, no Oeste do Kansas, numa área isolada a que os demais habitantes do Estado chamam “lá para diante”.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, Fevereiro de 2006, pág. 17; Tradução de Maria Isabel Braga; Obra Original: In Cold Blood, 1966)

Contribuição de Victor Figueiredo, Textos para Tudo.


#26 – 21 de Agosto de 2006 – Thomas Bernhard, O Náufrago

«Foi um suicídio longamente premeditado, pensei, e não um acto espontâneo de desespero.»

(Relógio D’Água, 1.ª edição, 1987, pág. ?; Tradução de Leopoldina Almeida; Obra Original: Der untergeher, 1983)

Contribuição de Carla Carvalho, Welcome to Elsinore.


#25 – 21 de Agosto de 2006 – Dinis Machado, O que diz Molero

«Teve uma infância estranha”, disse Austin. “Em última análise, todas as infâncias o são”, disse Mister DeLuxe.»

(Bertrand, 1.ª edição, 1977, pág. ?)

Contribuição de Mónica Granja, Linha do Norte.


#24 – 19 de Agosto de 2006 – Charles Bukowski, Mulheres

«Eu tinha cinquenta anos e há quatro que não ia para a cama com uma mulher.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, Julho de 2001, pág. 9; Tradução de Fernando Luís; Obra Original: Women, 1978)


#23 – 19 de Agosto de 2006 – Guillermo Cabrera Infante, Três Tristes Tigres

«O que nunca dissemos a ninguém foi que nós também fazíamos coisas debaixo do camião.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, Maio de 1997, pág. 25; Tradução de J. Teixeira de Aguilar e Maria do Carmo Abreu; Obra Original: Tres tristes tigres, 1967)


#22 – 18 de Agosto de 2006 – Ian McEwan, Amesterdão

«Dois ex-amantes de Molly Lane estavam à espera à porta da capela crematória, de costas para o frio de Fevereiro. Tudo aquilo já tinha sido dito, mas eles voltaram a dizê-lo.»

(Gradiva, 7.ª edição, Outubro de 2000, pág. 11; Tradução de Ana Falcão Bastos; Obra Original: Amsterdam, 1998)

Contribuição de Rui Miguel Brás, Coisas.


#21 – 18 de Agosto de 2006 – Milorad Pavic, Dicionário Khazar: romance-enciclopédia em 100.000 palavras

«O autor actual deste livro garante que o leitor não será condenado a morrer depois de o ter lido, como foi o destino dos seus predecessores, em 1691, quando o Dicionário Khazar ainda estava na sua primeira edição e quando o seu primeiro autor ainda vivia.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, 1990, pág. ?; Tradução de Herbert Daniel; Obra Original: Hazarski Recnik, 1984)

Contribuição de Mónica Granja, Linha do Norte.


#20 – 18 de Agosto de 2006 – Erico Veríssimo, Clarissa

«Só agora Amaro acredita que a primavera chegou: de sua janela vê Clarissa a brincar sob os pessegueiros floridos. As glicínias roxas espiam por cima do muro que separa o pátio da pensão do pátio da casa vizinha. O menino doente está na sua cadeira de rodas; o sol lhe ilumina o rosto pálido, atirando-lhe sobre os cabelos um polvilho de ouro. Um avião cruza o céu, roncando – asas coruscantes contra o azul nítido.»

(Livros do Brasil, 9.ª edição, 1979, pág. ?)

Contribuição de Manuel José Matos Nunes, Disperso Escrevedor.


#19 – 18 de Agosto de 2006 – Padre António Vieira, História do Futuro

«Nenhuma cousa se pode prometer à natureza humana mais conforme a seu maior apetite nem mais superior a toda sua capacidade, que a notícia dos tempos e sucessos futuros; e isto é o que oferece a Portugal, à Europa e ao Mundo esta nova e nunca ouvida História.»

(Brasil: Universidade de Brasília, 2005, pág. ?; Organização da obra por José Carlos Brandi Aleixo; Publicado originalmente em Portugal em 1718)

Contribuição de Jorge Andrade Silva, Prima Scripta.


#18 – 18 de Agosto de 2006 – Philip Roth, Teatro de Sabbath

«Ou deixas de foder outras ou está tudo acabado.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, 2000, pág. ?; Tradução de Fernanda Pinto Rodrigues; Obra Original: Sabbath's Theater, 1995)

Contribuição de João Gonçalves, Portugal dos Pequeninos.


#17 – 18 de Agosto de 2006 – Philip Roth, O Complexo de Portnoy

«Ela estava tão profundamente implantada na minha consciência que durante o meu primeiro ano de escola eu julguei, tanto quanto me lembro, que cada uma das minhas professoras era a minha mãe disfarçada.»

(Bertrand, 1.ª edição, Março de 1994, pág. 9; Tradução de Ana Luísa Faria; Obra Original: Portnoy's Complaint, 1969)


#16 – 17 de Agosto de 2006 – Camilo José Cela, Marzuca para Dois Mortos

«Chove mansamente e sem parar, chove sem vontade mas com uma infinita paciência, como toda a vida, chove sobre a terra que é da mesma cor que o céu, entre verde suave e cinzento suave, e a linha do monte já há muito se apagou.
– Há muitas horas?
– Não; há muitos anos. A linha do monte apagou-se aquando da morte de Lázaro Codesal, consta que Nosso Senhor não quis que ninguém voltasse a vê-la.Lázaro Codesal morreu em Marrocos, na posição de Tizzi-Azza; muito provavelmente matou-o um mouro da cabila de Tafersit. Lázaro Codesal tinha grande habilidade para engravidar raparigas…»

(Difel, 1996, pág. ?; Tradução de Maria Carlota Pracana e Salvato Telles de Menezes; Obra Original: Mazurca para dos muertos, 1983)

Contribuição de António Manuel Venda, A Floresta do Sul.


#15 – 17 de Agosto de 2006 – Miguel Esteves Cardoso, O Amor é Fodido

«Quanto mais vou sabendo de ti, mais gostaria que ainda estivesses viva. Só dois ou três minutos: o suficiente para te matar.»

(Assírio & Alvim, 12.ª edição, 2004, pág. 9)

Contribuição de Rui Miguel Brás, Coisas.


#14 – 17 de Agosto de 2006 – Francisco José Viegas, Longe de Manaus

«Há um vento daqueles, carregado de poeira, quente, tenso.»

(Asa, 2.ª edição, Maio de 2005, pág. 9)

Contribuição de Mónica Granja, Linha do Norte.


#13 – 17 de Agosto de 2006 – Albert Sánchez Piñol, A Pele Fria

«Nunca estamos infinitamente longe daqueles a quem odiamos.»

(Teorema, 1.ª edição, Janeiro de 2006, pág. 5; Tradução de Magda Bigotte de Figueiredo; Obra Original: La pell freda, 2002)


#12 – 17 de Agosto de 2006 – Adolfo Bioy Casares, A Invenção de Morel

«Hoje, nesta ilha, aconteceu um milagre. O Verão chegou cedo.»

(Antígona, 2.ª edição, Janeiro de 2003, pág. 13; Tradução de Miguel Serras Pereira e Maria Teresa Sá; Obra Original: La Invención de Morel, 1940)

Contribuição de Miguel Cardina, A Cidade Vaga.


#11 – 15 de Agosto de 2006 – António Lobo Antunes, Os Cus de Judas

«Do que eu gostava mais no Jardim Zoológico era do rinque de patinagem sob as árvores e do professor preto muito direito a deslizar para trás no cimento em elipses vagarosas sem mover um músculo sequer, rodeado de meninas de saias curtas e botas brancas, que, se falassem, possuíam seguramente vozes tão de gaze como as que nos aeroportos anunciam a partida dos aviões, sílabas de algodão que se dissolvem nos ouvidos à maneira de fios de rebuçado na concha da língua.»

(Dom Quixote, 25.ª edição, Novembro de 2004, pág. 11)


#10 – 15 de Agosto de 2006 – Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas

«Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte.»

(Brasil: L&PM, 2002, pág. 15)

Contribuição de Rui Miguel Brás, Coisas.


#9 – 12 de Agosto de 2006 – Franz Kafka, A Metamorfose

«Certa manhã, ao acordar após sonhos agitados, Gregor Samsa viu-se na sua cama, metamorfoseado num monstruoso insecto.»

(Guimarães, Março de 2000, pág. 9; Tradução de João Crisóstomo Gasco; Obra Original: Die Verwandlung, 1915)


#8 – 11 de Agosto de 2006 – António Alçada Baptista, O Riso de Deus

«A letra de Deus nem sempre é decifrável e ninguém conhece a língua em que escreveu a alma humana.»

(Presença, 16.ª edição, Dezembro de 2005, pág. 13)


#7 – 10 de Agosto de 2006 – Eduardo Mendonza, O Labirinto das Azeitonas

«– Senhores passageiros, em nome do comandante Flippo que, por sinal, retoma hoje o serviço após a sua recente operação às cataratas, damos-vos as boas vindas a bordo do voo 404 com destino a Madrid e desejamos-vos uma feliz viagem.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, Maio de 1991, pág. 9; Tradução de J. Teixeira de Aguilar; Obra Original: El laberinto de las aceitunas, 1982)

Contribuição de Pedro Vieira, irmaolucia.


#6 – 10 de Agosto de 2006 – J. G. Ballard, A Bondade das Mulheres

«Durante o Verão de 1937, em Xangai, eu descia o Bund todas as tardes para ver se a guerra já tinha começado.»

(Livros do Brasil, 1993, pág. 5; Tradução de Eduardo Saló; Obra Original: The Kindness of Women, 1991)


#5 – 8 de Agosto de 2006 – Vergílio Ferreira, Alegria Breve

«Enterrei hoje a minha mulher – porque lhe chamo minha mulher? Enterrei-a eu próprio no fundo do quintal, debaixo da velha figueira.»

(Bertrand, 7.ª edição, Março de 2004, pág. 9)

Sugestão de Pedro Correia, Corta-Fitas.


#4 – 5 de Agosto de 2006 – DBC Pierre, Vernon Little, O Bode Expiatório

«Está um calor de morrer em Martírio, mas os jornais que estão no alpendre até gelam com as notícias.»

(Gradiva, 1.ª edição, Dezembro de 2003, pág. 7; Tradução de Maria do Carmo Figueira; Obra Original: Vernon God Little, 2003)


#3 – 3 de Agosto de 2006 – Ian McEwan, O Jardim de Cimento

«Não matei o meu pai, mas às vezes sinto que contribuí para isso.»

(Gradiva, 4.ª edição, Março de 2005, pág. 7; Tradução de Cristina Ferreira de Almeida; Obra Original: The Cement Garden, 1978)


#2 – 3 de Agosto de 2006 – Chico Buarque, Budapeste

«Devia ser proibido debochar de quem se aventura em língua estrangeira.»

(Dom Quixote, 5.ª edição, Junho de 2005, pág. 11; Revisão de Fernanda Abreu; Obra Original: Budapeste, 2003)


#1 – 2 de Agosto de 2006 – Sándor Márai, A herança de Eszter

«Não sei o que Deus ainda me reserva. Mas, antes de morrer, quero escrever a história do dia em que Lajos veio ver-me pela última vez e me roubou.»

(Dom Quixote, 1.ª edição, Julho de 2006, pág. 7; Tradução de Ernesto Rodrigues; Original: Eszter Hagyatéka, 1939)

100 Best First Lines from Novels - American Book Review

1. Call me Ishmael.
«Tratem-me por Ismael.»
(Herman Melville, Moby Dick, Europa-América, Novembro de 2002, pág. 31; tradução de Joaquim L. Duarte Peixoto; obra original: Moby-Dick, 1851)


2. It is a truth universally acknowledged, that a single man in possession of a good fortune, must be in want of a wife.

«É uma verdade universalmente reconhecida que um homem solteiro na posse de uma grande fortuna necessita de uma esposa.»
(Janes Austen, Orgulho e Preconceito, Europa-América, 3.ª edição, Janeiro de 2006, pág. 5; tradução de Maria Francisca Ferreira de Lima; obra original: Pride and Prejudice, 1813)


3. A screaming comes across the sky.

«Uma berraria vem através do céu.»
(Thomas PynchonArco-Íris da Gravidade, Bertrand, 1.ª edição, Outubro de 2012, pág. 11; tradução de Jorge Pereirinha Pires; obra original: Gravity's Rainbow, 1973)


4. Many years later, as he faced the firing squad, Colonel Aureliano Buendía was to remember that distant afternoon when his father took him to discover ice.

«Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o coronel Aureliano Buendía haveria de recordar aquela tarde remota em que o pai o levou a conhecer o gelo.»
(Gabriel García Márquez, Cem anos de Solidão, Dom Quixote, 7.ª edição, Maio de 1992, pág. 9; tradução de Margarida Santiago; Obra original: Cien Años de Soledad, 1967; Obra traduzida citada em inglês: One Hundred Years of Solitude, 1967; trans. Gregory Rabassa)


5. Lolita, light of my life, fire of my loins.

«Lolita, luz da minha vida, fogo da minha virilidade.»
(Vladimir Nabokov, Lolita, Teorema, 2.ª edição, 1998, pág. 11; tradução de Fernanda Pinto Rodrigues; obra original: Lolita, 1955)


6. Happy families are all alike; every unhappy family is unhappy in its own way.
«Todas as famílias felizes se parecem umas com as outras, cada família infeliz é infeliz à sua maneira.»
(Lev Tolstoi, Anna Karénina, Relógio D'Água, 2006, pág. ?; tradução de António Pescada; Obra original: Anna Karenina, 1877; Obra traduzida citada em inglês: Anna Karenina; trans. Constance Garnett)


7. riverrun, past Eve and Adam's, from swerve of shore to bend of bay, brings us by a commodius vicus of recirculation back to Howth Castle and Environs. — James Joyce, Finnegans Wake (1939)

8. It was a bright cold day in April, and the clocks were striking thirteen.

«Era um dia claro e frio de Abril, nos relógios batiam as treze.»
(George Orwell, Mil novecentos e oitenta e quatro, Antígona, Junho de 2004, pág. 7; tradução de Ana Luísa Faria; obra original: 1984, 1949)


9. It was the best of times, it was the worst of times, it was the age of wisdom, it was the age of foolishness, it was the epoch of belief, it was the epoch of incredulity, it was the season of Light, it was the season of Darkness, it was the spring of hope, it was the winter of despair.
«Era o melhor de todos os tempos, era o pior de todos os tempos, era a idade da sabedoria, era a idade do disparate, era a época da fé, era a época da descrença, era a estação da Lua, era a estação da Treva, era a primavera da esperança, era o inverno do desespero (...)»
Charles Dickens, História de Duas Cidades, Civilização, Janeiro de 1975, pág. 19; tradução de Daniel Augusto Alves; obra original: A Tale of Two Cities, 1859)


10. I am an invisible man.

«Sou um homem invisível.»
(Ralph Ellison, O Homem Invisível, Casa das Letras, 1.ª edição, Fevereiro de 2006, pág. 9; tradução de Salvato Telles de Menezes e Rui Andrade; obra original: Invisible Man, 1952)


11. The Miss Lonelyhearts of the New York Post-Dispatch (Are you in trouble?—Do-you-need-advice?—Write-to-Miss-Lonelyhearts-and-she-will-help-you) sat at his desk and stared at a piece of white cardboard. — Nathanael West, Miss Lonelyhearts (1933)

12. You don't know about me without you have read a book by the name of The Adventures of Tom Sawyer; but that ain't no matter.
«Vossemecês não me conhecem se não leram um livro chamado As aventuras de Tom Sawyer, mas isso não tem importância.»
(Mark Twain, As aventuras de Huckleberry Finn, Público, 2004, pág. ?; tradução de Daniel Augusto Gonçalves; obra original: Adventures of Huckleberry Finn, 1885)


13. Someone must have slandered Josef K., for one morning, without having done anything truly wrong, he was arrested.

«Alguém devia ter caluniado Josef K., porque foi preso uma manhã, sem que ele houvesse feito alguma coisa mal.»
(Franz Kafka, O Processo, Guimarães, Abril de 2002, pág. 11; tradução de João Costa e Delfim Brito; obra original: Der Process, 1925; Obra traduzida citada em inglês: The Trial; trans. Breon Mitchell)


14. You are about to begin reading Italo Calvino's new novel, If on a winter's night a traveler.

«Estás para começar a ler o novo romance Se numa noite de Inverno um viajante de Italo Calvino»
(Italo Calvino, Se numa noite de Inverno um viajante, Teorema, Fevereiro de 2001, pág. 21; tradução de José Colaço Barreiros; obra original: Se una notte d'inverno un viaggiatore, 1979; Obra traduzida citada em inglês: If on a winter's night a traveler; trans. William Weaver)


15. The sun shone, having no alternative, on the nothing new.

«Não tendo alternativa, o sol brilhava sobre o nada de novo»
(Samuel Beckett, Murphy, Assírio & Alvim, Junho de 2003, pág. 9; tradução de Maria Jorge Vilar de Figueiredo; obra original: Murphy, 1938)


16. If you really want to hear about it, the first thing you'll probably want to know is where I was born, and what my lousy childhood was like, and how my parents were occupied and all before they had me, and all that David Copperfield kind of crap, but I don't feel like going into it, if you want to know the truth.

«Se estão mesmo interessados nisto, então a primeira coisa que devem querer saber é onde é que nasci, e como foi a porcaria da minha infância, o que faziam os meus pais e tudo antes de eu ter nascido, e toda essa treta estilo David Copperfield, mas não estou nada para aí virado, para dizer a verdade.»
(J. D. Salinger, À espera no centeio, Difel, Janeiro de 2005, pág. 9; tradução de José Lima; Obra original: The Catcher in the Rye, 1951)


17. Once upon a time and a very good time it was there was a moocow coming down along the road and this moocow that was coming down along the road met a nicens little boy named baby tuckoo.

«Era uma vez, nos doces tempos de outrora, uma vaca-muu que vinha pela estrada abaixo, e essa vaca-muu que vinha pela estrada abaixo encontrou um amor miúdo chamado bebé-petenino…»
(James Joyce, Retrato do Artista quando Jovem, Difel, 2.ª edição, Junho de 2002, pág. 25; tradução de Alfredo Margarido; obra original: A Portrait of the Artist as a Young Man, 1916)


18. This is the saddest story I have ever heard.
«Esta é a história mais triste jamais contada.»
(Ford Madox Ford, O Bom Soldado, Teorema, Maio de 2004, pág. 17; tradução de Telma Costa; obra original: The Good Soldier, 1915)

19. I wish either my father or my mother, or indeed both of them, as they were in duty both equally bound to it, had minded what they were about when they begot me; had they duly considered how much depended upon what they were then doing;—that not only the production of a rational Being was concerned in it, but that possibly the happy formation and temperature of his body, perhaps his genius and the very cast of his mind;—and, for aught they knew to the contrary, even the fortunes of his whole house might take their turn from the humours and dispositions which were then uppermost:—Had they duly weighed and considered all this, and proceeded accordingly,—I am verily persuaded I should have made a quite different figure in the world, from that, in which the reader is likely to see me.

«Quem me dera que o meu pai, ou a minha mãe, ou ambos, para dizer a verdade, uma vez que ambos estavam de serviço na ocasião, tivessem prestado mais atenção ao que estavam a fazer quando me conceberam; tivessem eles tomado em devida conta o quanto eu dependia daquilo que estavam então a fazer;–já que não estava em causa apenas a produção de um Ser racional, mas possivelmente a boa formação e temperatura do seu corpo, talvez até o seu génio e a qualidade do seu espírito;–e, apesar do que pudessem pensar em contrário, mesmo a fortuna da sua casa podia ser determinada pelos humores e disposições que fossem então dominantes:––Tivessem eles tomado tudo isto em devida conta, e procedido em conformidade,––estou verdadeiramente convencido que eu teria feito outra figura no mundo, muito diferente daquela em que o leitor provavelmente me há-de ver.»
(Laurence Sterne, A vida e opiniões de Tristram Shandy – parte primeira, Antígona, 2.ª edição, Novembro de 1998, pp. 57-58; tradução de Manuel Portela; obra original: The Life and Opinions of Tristram Shandy, Gentleman, 1759-1767)


20. Whether I shall turn out to be the hero of my own life, or whether that station will be held by anybody else, these pages must show.
«Serei o herói da minha própria existência ou este papel terá sido desempenhado por outro? Estas páginas o dirão.»
(Charles Dickens, David Copperfield, Romano Torres, 2.ª edição, 1959, pág. 11; tradução de Mário Domingues; obra original: David Copperfield, 1850)


21. Stately, plump Buck Mulligan came from the stairhead, bearing a bowl of lather on which a mirror and a razor lay crossed.

«Pomposo, roliço, Buck Mulligan, veio do alto da escada, trazendo uma tigela com espuma de barbear, na qual se cruzavam, em cima, um espelho e uma navalha.»
(James Joyce, Ulisses, Livros do Brasil, Maio de 2005, pág. 29; tradução de João Palma-Ferreira; obra original: Ulysses, 1922)


22. It was a dark and stormy night; the rain fell in torrents, except at occasional intervals, when it was checked by a violent gust of wind which swept up the streets (for it is in London that our scene lies), rattling along the house-tops, and fiercely agitating the scanty flame of the lamps that struggled against the darkness. — Edward George Bulwer-Lytton, Paul Clifford (1830)

23. One summer afternoon Mrs. Oedipa Maas came home from a Tupperware party whose hostess had put perhaps too much kirsch in the fondue to find that she, Oedipa, had been named executor, or she supposed executrix, of the estate of one Pierce Inverarity, a California real estate mogul who had once lost two million dollars in his spare time but still had assets numerous and tangled enough to make the job of sorting it all out more than honorary.
«Numa tarde de Verão, Mrs. Oedipa Maas voltou a casa depois de uma reunião da Tupperware, cuja anfitriã talvez tenha exagerado o Krisch no fondue para descobrir que ela, Oedipa, tinha sido nomeada testamenteiro, ou melhor testamenteira, de um tal Pierce Inverarity, um magnata de bens imóveis na Califórnia, que em tempos perdeu só de uma vez dois milhões de dólares, por simples prazer, mas que ainda deixou uma herança tão vasta e complicada que a tarefa de a resolver nada tem de honorífico.»
(Thomas Pynchon, O Leilão do Lote 49, Fragmentos, Junho de 1987, pág. 9; tradução de Manuela Garcia Marques; obra original: The Crying of Lot 49, 1966)

24. It was a wrong number that started it, the telephone ringing three times in the dead of night, and the voice on the other end asking for someone he was not.

«Foi uma chamada para o número errado que despoletou tudo, o telefone a tocar três vezes no silêncio da noite, e a voz do outro lado da linha a perguntar por alguém que não era ele.»
(Paul Auster, “Cidade de Vidro” em A Trilogia de Nova Iorque, Asa, 3.ª Edição, Outubro de 2000, pág. 9; tradução de Alberto Gomes; obra original: City of Glass, 1985)


25. Through the fence, between the curling flower spaces, I could see them hitting.

«Através da cerca, por entre os intervalos das pétalas encaracoladas, eu via-os a dar tacadas.»
(William Faulkner, O som e a fúria, Dom Quixote, 4.ª edição, Maio de 2004, pág. 11; tradução de Ana Maria Chaves; obra original: The Sound and the Fury, 1929)


26. 124 was spiteful.
«O 124 era rancoroso.»
(Toni Morrison, Beloved, Dom Quixote, 1.ª edição, Junho de 2009, pág. 13; tradução de Maria João Freire de Andrade; obra original: Beloved, 1987)


27. Somewhere in la Mancha, in a place whose name I do not care to remember, a gentleman lived not long ago, one of those who has a lance and ancient shield on a shelf and keeps a skinny nag and a greyhound for racing.

«Num lugar da Mancha, de cujo nome não quero lembrar-me, não há muito tempo que vivia um fidalgo dos de lança em cabide, adarga antiga, rocim fraco e galgo corredor»
(Miguel de Cervantes, O Engenhoso Fidalgo D. Quixote de la Mancha, Civilização, 1999, Vol. I, pág. 25; tradução de Daniel Augusto Gonçalves e Arsénio Mota; obra original: El ingenioso hidalgo Don Quixote de la Mancha; Título posterior: Don Quijote de la Mancha; Obra traduzida citada em inglês: Don Quixote; trans. Edith Grossman)


28. Mother died today.

«Hoje, a mãe morreu.»
(Albert Camus, O Estrangeiro, Livros do Brasil, 1.ª edição, Abril de 2001, pág. 31; tradução de António Quadros; obra original: L’Étranger, 1942; Obra traduzida citada em inglês: The Stranger; trans. Stuart Gilbert)



29. Every summer Lin Kong returned to Goose Village to divorce his wife, Shuyu.
«Lin Kong regressava todos os Verões à aldeia do Ganso para se divorciar da mulher, Shuyu.»
(Ha Jin, À Espera, Gradiva, 1.ª edição, Maio de 2000, pág. 9; tradução de Rui Pires Cabral; Obra traduzida citada em inglês: Waiting, 1999)


30. The sky above the port was the color of television, tuned to a dead channel.
«O céu por cima do porto era da cor de um aparelho de TV sintonizado num canal sem emissão.»
(William Gibson, Neuromante, Gradiva, 2.ª edição, Abril de 2004, pág. 11; tradução de Fernando Correia Marques; obra original: Neuromancer, 1984)


31. I am a sick man . . . I am a spiteful man.

«Sou um homem doente… Sou um homem mau.»
(Fiódor Dostoievski, Cadernos do Subterrâneo, Assírio & Alvim, Dezembro de 2000, pág. 13; tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra; obra original: Zapíski Podpólia, 1864; Obra traduzida citada em inglês: Notes from Underground; trans. Michael R. Katz)


32. Where now? Who now? When now?

«Agora, onde? Agora, quando? Agora, quem?»
(Samuel Beckett, O Inominável, Assírio & Alvim, Março de 2002, pág. 7; tradução de Maria Jorge Vilar de Figueiredo; obra original: L’Innomable, 1953; Obra traduzida citada em inglês: The Unnamable; trans. Patrick Bowles)


33. Once an angry man dragged his father along the ground through his own orchard. "Stop!" cried the groaning old man at last, "Stop! I did not drag my father beyond this tree." — Gertrude Stein, The Making of Americans (1925)

34. In a sense, I am Jacob Horner. — John Barth, The End of the Road (1958)

35. It was like so, but wasn't. — Richard Powers, Galatea 2.2 (1995)

36. —Money . . . in a voice that rustled. — William Gaddis, J R (1975)

37. Mrs. Dalloway said she would buy the flowers herself.

«Mrs. Dalloway disse que ela própria ia comprar as flores.»
(Virginia Woolf, Mrs. Dalloway, Relógio D’Água, Janeiro de 2004, pág. 7; tradução de José Miguel Silva; obra original: Mrs. Dalloway, 1925)


38. All this happened, more or less.

«Mais ou menos tudo isto aconteceu.»
(Kurt Vonnegut, Matadouro Cinco ou A Cruzada das Crianças, Editorial Futura, Junho de 1973, pág. 11; tradução de Maria Joana Labro; obra original: Slaughterhouse-Five, 1969)


39. They shoot the white girl first. — Toni Morrison, Paradise (1998)

40. For a long time, I went to bed early.

«Durante muito tempo fui para a cama cedo.»
(Marcel Proust, Em busca do tempo perdido (vol. I): Do lado de Swann, Relógio D’Água, 3.ª edição, Outubro de 2003, pág. 9; tradução de Pedro Tamen; obra original: À la recherche du temps perdu: Du Côté de chez Swann, 1913; Obra traduzida citada em inglês: Swann's Way; trans. Lydia Davis)


41. The moment one learns English, complications set in. — Felipe Alfau, Chromos (1990)

42. Dr. Weiss, at forty, knew that her life had been ruined by literature. — Anita Brookner, The Debut (1981)

43. I was the shadow of the waxwing slain / By the false azure in the windowpane;

«Fui a sombra do ampalis despenhando-se / No céu falso da vidraça;»
(Vladimir Nabokov, Fogo Pálido, Teorema, 1996, pág. 29; tradução de Telma Costa; obra original: Pale Fire, 1962)


44. Ships at a distance have every man's wish on board. — Zora Neale Hurston, Their Eyes Were Watching God (1937)

45. I had the story, bit by bit, from various people, and, as generally happens in such cases, each time it was a different story. — Edith Wharton, Ethan Frome (1911)

46. Ages ago, Alex, Allen and Alva arrived at Antibes, and Alva allowing all, allowing anyone, against Alex's admonition, against Allen's angry assertion: another African amusement . . . anyhow, as all argued, an awesome African army assembled and arduously advanced against an African anthill, assiduously annihilating ant after ant, and afterward, Alex astonishingly accuses Albert as also accepting Africa's antipodal ant annexation. — Walter Abish, Alphabetical Africa (1974)

47. There was a boy called Eustace Clarence Scrubb, and he almost deserved it. — C. S. Lewis, The Voyage of the Dawn Treader (1952)

48. He was an old man who fished alone in a skiff in the Gulf Stream and he had gone eighty-four days now without taking a fish.

«Era um velho que pescava sozinho num esquife na Corrente do Golfo, e saíra havia já por oitenta e quatro dias sem apanhar um peixe.»
(Ernest Hemingway, O Velho e o Mar, Livros do Brasil, Outubro de 2004, pág. 13; tradução de Jorge de Sena; obra original: The Old Man and the Sea, 1952)


49. It was the day my grandmother exploded. — Iain M. Banks, The Crow Road (1992)

50. I was born twice: first, as a baby girl, on a remarkably smogless Detroit day in January of 1960; and then again, as a teenage boy, in an emergency room near Petoskey, Michigan, in August of 1974.

«Comecei por dizer que nasci duas vezes: primeiro como menina bebé, num dia invulgarmente limpo na cidade de Detroit, em Janeiro de 1960. Depois, outra vez, como rapaz adolescente, numa sala de urgências perto de Petosky, Michigan, em Agosto de 1974.»
(Jeffrey Eugenides, Middlesex, Dom Quixote, 1.ª edição, Março de 2004, pág. 13; tradução de Pedro Serras Pereira; obra original: Middlesex, 2002)


51. Elmer Gantry was drunk. — Sinclair Lewis, Elmer Gantry (1927)

52. We started dying before the snow, and like the snow, we continued to fall. — Louise Erdrich, Tracks (1988)

53. It was a pleasure to burn.

«Era um prazer queimar.»
(Ray Bradbury, Fahrenheit 451, Europa-América, Setembro de 2002, pág. 11; Tradição de Teresa da Costa Pinto Pereira; obra original: Fahrenheit 451, 1953)


54. A story has no beginning or end; arbitrarily one chooses that moment of experience from which to look back or from which to look ahead.
«Uma história não tem princípio ou fim: escolhemos arbitrariamente um momento da experiência, de onde olhar para trás, ou olhar para diante.»
(Graham Greene, O Fim da Aventura, Asa, 1.ª edição, Fevereiro de 1995, pág. 19; tradução de Jorge de Sena; obra original: The End of the Affair, 1951)


55. Having placed in my mouth sufficient bread for three minutes' chewing, I withdrew my powers of sensual perception and retired into the privacy of my mind, my eyes and face assuming a vacant and preoccupied expression. — Flann O'Brien, At Swim-Two-Birds (1939)

56. I was born in the Year 1632, in the City of York, of a good Family, tho' not of that Country, my Father being a Foreigner of Bremen, who settled first at Hull; He got a good Estate by Merchandise, and leaving off his Trade, lived afterward at York, from whence he had married my Mother, whose Relations were named Robinson, a very good Family in that Country, and from whom I was called Robinson Kreutznaer; but by the usual Corruption of Words in England, we are now called, nay we call our selves, and write our Name Crusoe, and so my Companions always call'd me.

«Nasci na cidade de Iorque no ano de 1632, originário de uma boa família, mas estrangeira no país. O meu pai, natural de Brema, dedicou-se ao comércio em Hull, onde adquiriu uma fortuna muito confortável. Mais tarde, retirou-se dos negócios e foi viver para Iorque, onde casou com minha mãe, que pertencia à família Robinson, uma das melhores do Condado. Daí deriva o meu nome, Robinson Kreutznaer, a seguir transformado por corruptela, muito corrente em Inglaterra, no de Crusoe, com qual hoje se chama e se assina a minha família e eu próprio também. Os meus companheiros nunca me chamaram de outro modo.»
(Daniel Defoe, As Aventuras de Robinson Crusoe, Dom Quixote, 1.ª edição, Outubro de 2001, pp. 7-8; tradução de M. Henriques; Revisão de Alice Vieira; obra original: Robinson Crusoe, 1719)


57. In the beginning, sometimes I left messages in the street. — David Markson, Wittgenstein's Mistress (1988)

58. Miss Brooke had that kind of beauty which seems to be thrown into relief by poor dress.

«Miss Brooke tinha aquele género de beleza que parece sobressair da simplicidade do trajo.»
(George Eliot, A vida era assim em Middlemarch, Portugália, 1.ª edição, Março de 2009, pág. 11; tradução de Mário Domingues; obra original: Middlemarch, 1872)


59. It was love at first sight.
«Foi amor à primeira vista.»
(Joseph Heller, Catch 22 (Artigo 22), Dom Quixote, 2.ª edição, Julho de 1986, pág. 11; tradução de Eduardo Saló; obra original: Catch-22, 1961)


60. What if this young woman, who writes such bad poems, in competition with her husband, whose poems are equally bad, should stretch her remarkably long and well-made legs out before you, so that her skirt slips up to the tops of her stockings? — Gilbert Sorrentino, Imaginative Qualities of Actual Things (1971)

61. I have never begun a novel with more misgiving.

«Nunca senti maior apreensão ao começar um romance.»
(W. Somerset Maugham, O Fio da Navalha, Livros Unibolso, Ano, pág; tradução Lígia Junqueira Smith; obra original: The Razor's Edge, 1944)


62. Once upon a time, there was a woman who discovered she had turned into the wrong person. — Anne Tyler, Back When We Were Grownups (2001)

63. The human race, to which so many of my readers belong, has been playing at children's games from the beginning, and will probably do it till the end, which is a nuisance for the few people who grow up. — G. K. Chesterton, The Napoleon of Notting Hill (1904)

64. In my younger and more vulnerable years my father gave me some advice that I've been turning over in my mind ever since.

«Era eu rapaz, e ainda impressionável, meu pai deu-me um dia um conselho que, desde então, me ficou às voltas na cabeça.»
(F. Scott Fitzgerald, O Grande Gatsby, Presença, 5.ª edição, Julho de 1997, pág. 31; tradução de José Rodrigues Miguéis; obra original: The Great Gatsby, 1925)


65. You better not never tell nobody but God. — Alice Walker, The Color Purple (1982)

66. "To be born again," sang Gibreel Farishta tumbling from the heavens, "first you have to die."

«“Para se nascer de novo”, entoou Gibreel Farishta, caindo dos céus, “é preciso primeiro morrer”.»
(Salman Rushdie, Versículos Satânicos, Dom Quixote, 11.ª edição, Março de 2004, pág. 15; tradução de Ana Luísa Faria e Miguel Serras Pereira; obra original: The Satanic Verses, 1988)


67. It was a queer, sultry summer, the summer they electrocuted the Rosenbergs, and I didn't know what I was doing in New York.

«Era um Verão estranho e sufocante, aquele em que electrocutaram os Rosenberg. Estava então em Nova Iorque sem saber ao certo porquê.»
(Sylvia Plath, A Campânula de Vidro, Assírio & Alvim, 2.ª edição, Setembro de 2002, pág. 9; tradução de Mário Avelar; obra original: The Bell Jar, 1963)


68. Most really pretty girls have pretty ugly feet, and so does Mindy Metalman, Lenore notices, all of a sudden. — David Foster Wallace, The Broom of the System (1987)

69. If I am out of my mind, it's all right with me, thought Moses Herzog.

«Posso não estar bom da cabeça, mas tudo me parece claro, pensou Moisés Herzog.»
(Saul Bellow, Herzog, Relógio D’Água, 2.ª edição, 1988, pág. 7; tradução de Luísa Ducla Soares; obra original: Herzog, 1964)


70. Francis Marion Tarwater's uncle had been dead for only half a day when the boy got too drunk to finish digging his grave and a Negro named Buford Munson, who had come to get a jug filled, had to finish it and drag the body from the breakfast table where it was still sitting and bury it in a decent and Christian way, with the sign of its Saviour at the head of the grave and enough dirt on top to keep the dogs from digging it up.

«O tio de Francis Marion Tarwater estava morto há meio dia apenas quando o rapaz ficou demasiado bêbado para acabar de abrir a sepultura e um negro chamado Buford Munson, que ali viera pedir para lhe encherem um jarro, teve de terminar o serviço e arrastar o cadáver para longe da mesa posta para o pequeno-almoço, à qual se encontrava ainda sentado, de modo a sepultá-lo condignamente e de acordo com os preceitos cristãos, com o sinal do Salvador à cabeceira e terra em cima quanta bastasse para desencorajar os cães de desenterrem [sic] o defunto.»
(Flannery O'Connor, O Céu é dos Violentos, Cavalo de Ferro, Setembro de 2008, pág. 5; tradução de Luís Coimbra; obra original: The Violent Bear it Away, 1960)


71. Granted: I am an inmate of a mental hospital; my keeper is watching me, he never lets me out of his sight; there's a peephole in the door, and my keeper's eye is the shade of brown that can never see through a blue-eyed type like me.
«De acordo: estou internado numa casa de saúde. O meu enfermeiro observa-me, guarda-me com a vista; é que na porta há uma fresta e os olhos dele têm um tom castanho que não pode radiografar-me, pois o tom dos meus é azul.»
(Günter Grass, O Tambor, Estúdios Cor, Maio de 1964, pág. 9; tradução de Augusto Abelaira; obra original: Die Blechtrommel, 1959; Obra traduzida citada em inglês: The Tin Drum, 1959; trans. Ralph Manheim)


72. When Dick Gibson was a little boy he was not Dick Gibson. — Stanley Elkin, The Dick Gibson Show (1971)

73. Hiram Clegg, together with his wife Emma and four friends of the faith from Randolph Junction, were summoned by the Spirit and Mrs. Clara Collins, widow of the beloved Nazarene preacher Ely Collins, to West Condon on the weekend of the eighteenth and nineteenth of April, there to await the End of the World. — Robert Coover, The Origin of the Brunists (1966)

74. She waited, Kate Croy, for her father to come in, but he kept her unconscionably, and there were moments at which she showed herself, in the glass over the mantel, a face positively pale with the irritation that had brought her to the point of going away without sight of him. — Henry James, The Wings of the Dove (1902)

75. In the late summer of that year we lived in a house in a village that looked across the river and the plain to the mountains.

«Para o fim do Verão daquele ano vivíamos numa aldeia que, para lá do rio e da planície, confrontava as montanhas.»
(Ernest Hemingway, O Adeus às Armas, Livros do Brasil, 1.ª edição, Outubro de 2003, pág. 19; tradução de Adolfo Casais Monteiro; obra original: A Farewell to Arms, 1929)


76. "Take my camel, dear," said my Aunt Dot, as she climbed down from this animal on her return from High Mass. — Rose Macaulay, The Towers of Trebizond (1956)

77. He was an inch, perhaps two, under six feet, powerfully built, and he advanced straight at you with a slight stoop of the shoulders, head forward, and a fixed from-under stare which made you think of a charging bull.
«Faltava-lhe uma polegada, ou talvez duas, para medir seis pés, era de compleição vigorosa e avançava direito sobre as pessoas, com um ligeiro curvar dos ombros, com a cabeça para a frente e uma maneira de olhar por baixo, com os olhos fixos, que lembrava um touro a carregar.»
(Joseph Conrad, Lord Jim, Europa-América, 1978, pág. 9; tradução de Cármen González; obra original: Lord Jim, 1900
)

78. The past is a foreign country; they do things differently there.
«O passado é um país estrangeiro; lá fazem-se as coisas de maneira diferente.»
(L. P. Hartley, O Mensageiro, Presença, 1.ª edição, 1990; tradução de Maria Adelaide Freire; obra original: The Go-Between, 1953)


79. On my naming day when I come 12 I gone front spear and kilt a wyld boar he parbly ben the las wyld pig on the Bundel Downs any how there hadnt ben none for a long time befor him nor I aint looking to see none agen. — Russell Hoban, Riddley Walker (1980)

80. Justice?—You get justice in the next world, in this world you have the law. — William Gaddis, A Frolic of His Own (1994)

81. Vaughan died yesterday in his last car-crash.

«Vaughan morreu ontem ao chocar com o carro pela última vez.»
(J. G. Ballard, Crash, Relógio D’Água, ano, pág.; tradução Paulo Faria; obra original: Crash, 1973)


82. I write this sitting in the kitchen sink. — Dodie Smith, I Capture the Castle (1948)

83. "When your mama was the geek, my dreamlets," Papa would say, "she made the nipping off of noggins such a crystal mystery that the hens themselves yearned toward her, waltzing around her, hypnotized with longing." — Katherine Dunn, Geek Love (1983)

84. In the last years of the Seventeenth Century there was to be found among the fops and fools of the London coffee-houses one rangy, gangling flitch called Ebenezer Cooke, more ambitious than talented, and yet more talented than prudent, who, like his friends-in-folly, all of whom were supposed to be educating at Oxford or Cambridge, had found the sound of Mother English more fun to game with than her sense to labor over, and so rather than applying himself to the pains of scholarship, had learned the knack of versifying, and ground out quires of couplets after the fashion of the day, afroth with Joves and Jupiters, aclang with jarring rhymes, and string-taut with similes stretched to the snapping-point. — John Barth, The Sot-Weed Factor (1960)

85. When I finally caught up with Abraham Trahearne, he was drinking beer with an alcoholic bulldog named Fireball Roberts in a ramshackle joint just outside of Sonoma, California, drinking the heart right out of a fine spring afternoon. — James Crumley, The Last Good Kiss (1978)

86. It was just noon that Sunday morning when the sheriff reached the jail with Lucas Beauchamp though the whole town (the whole county too for that matter) had known since the night before that Lucas had killed a white man. —William Faulkner, Intruder in the Dust (1948)

87. I, Tiberius Claudius Drusus Nero Germanicus This-that-and-the-other (for I shall not trouble you yet with all my titles) who was once, and not so long ago either, known to my friends and relatives and associates as "Claudius the Idiot," or "That Claudius," or "Claudius the Stammerer," or "Clau-Clau-Claudius" or at best as "Poor Uncle Claudius," am now about to write this strange history of my life; starting from my earliest childhood and continuing year by year until I reach the fateful point of change where, some eight years ago, at the age of fifty-one, I suddenly found myself caught in what I may call the "golden predicament" from which I have never since become disentangled. — Robert Graves, I, Claudius (1934)

88. Of all the things that drive men to sea, the most common disaster, I've come to learn, is women. — Charles Johnson, Middle Passage (1990)

89. I am an American, Chicago born—Chicago, that somber city—and go at things as I have taught myself, free-style, and will make the record in my own way: first to knock, first admitted; sometimes an innocent knock, sometimes a not so innocent.

«Sou americano, nascido em Chicago – Chicago, aquela cidade sombria –, e encaro as coisas da maneira que aprendi a fazer sozinho, em estilo livre. Vou, portanto, fazer o relato à minha maneira: o que bater primeiro, é o primeiro a entrar; às vezes uma pancada inocente, outras nem tanto.»
(Saul Bellow, As Aventuras de Augie March, Quetzal, 2010, pág. 9; tradução de Salvato Telles de Menezes; obra original: The Adventures of Augie March, 1953)

90. The towers of Zenith aspired above the morning mist; austere towers of steel and cement and limestone, sturdy as cliffs and delicate as silver rods.
«As torres de Zenith erguiam-se acima da bruma da manhã; torres austeras de aço e cimento e pedra calcária, robustas como penhascos e delicadas como varetas de prata.»
(Sinclair Lewis, Babbitt, Difel, 1991, pág. 9; tradução de Daniel Gonçalves; obra original: Babbitt, 1922)


91. I will tell you in a few words who I am: lover of the hummingbird that darts to the flower beyond the rotted sill where my feet are propped; lover of bright needlepoint and the bright stitching fingers of humorless old ladies bent to their sweet and infamous designs; lover of parasols made from the same puffy stuff as a young girl's underdrawers; still lover of that small naval boat which somehow survived the distressing years of my life between her decks or in her pilothouse; and also lover of poor dear black Sonny, my mess boy, fellow victim and confidant, and of my wife and child. But most of all, lover of my harmless and sanguine self. — John Hawkes, Second Skin (1964)

92. He was born with a gift of laughter and a sense that the world was mad. — Raphael Sabatini, Scaramouche (1921)

93. Psychics can see the color of time it's blue. — Ronald Sukenick, Blown Away (1986)

94. In the town, there were two mutes and they were always together.

«Havia na cidade dois mudos que eram inseparáveis.»
(Carson McCullers, Coração Solitário Caçador, Europa-América, ano, pág.; tradução de José Rodrigues Miguéis; obra original: The Heart is a Lonely Hunter, 1940)


95. Once upon a time two or three weeks ago, a rather stubborn and determined middle-aged man decided to record for posterity, exactly as it happened, word by word and step by step, the story of another man for indeed what is great in man is that he is a bridge and not a goal, a somewhat paranoiac fellow unmarried, unattached, and quite irresponsible, who had decided to lock himself in a room a furnished room with a private bath, cooking facilities, a bed, a table, and at least one chair, in New York City, for a year 365 days to be precise, to write the story of another person—a shy young man about of 19 years old—who, after the war the Second World War, had come to America the land of opportunities from France under the sponsorship of his uncle—a journalist, fluent in five languages—who himself had come to America from Europe Poland it seems, though this was not clearly established sometime during the war after a series of rather gruesome adventures, and who, at the end of the war, wrote to the father his cousin by marriage of the young man whom he considered as a nephew, curious to know if he the father and his family had survived the German occupation, and indeed was deeply saddened to learn, in a letter from the young man—a long and touching letter written in English, not by the young man, however, who did not know a damn word of English, but by a good friend of his who had studied English in school—that his parents both his father and mother and his two sisters one older and the other younger than he had been deported they were Jewish to a German concentration camp Auschwitz probably and never returned, no doubt having been exterminated deliberately X * X * X * X, and that, therefore, the young man who was now an orphan, a displaced person, who, during the war, had managed to escape deportation by working very hard on a farm in Southern France, would be happy and grateful to be given the opportunity to come to America that great country he had heard so much about and yet knew so little about to start a new life, possibly go to school, learn a trade, and become a good, loyal citizen. — Raymond Federman, Double or Nothing (1971)

96. Time is not a line but a dimension, like the dimensions of space.
«O Tempo não é uma linha mas uma dimensão, como as dimensões do espaço.»
(Margaret Atwood, Olho de Gato, Europa-América, 1990, pág. 15; tradução de Ana Heizkessel; obra original: Cat's Eye, 1988)


97. He—for there could be no doubt of his sex, though the fashion of the time did something to disguise it—was in the act of slicing at the head of a Moor which swung from the rafters.

«Ele – pois não poderia haver dúvidas quanto ao seu sexo, embora a moda da época contribuísse até certo ponto para o dissimular – estava a golpear uma cabeça de mouro suspensa das vigas do telhado.»
(Virginia Woolf, Orlando, Relógio D’Água, 1994, pág. 13; tradução de Ana Luísa Faria; obra original: Orlando, 1928)


98. High, high above the North Pole, on the first day of 1969, two professors of English Literature approached each other at a combined velocity of 1200 miles per hour.

«No primeiro dia de 1969, lá bem alto sobre o Pólo Norte, dois professores de Literatura Inglesa aproximavam-se um do outro à velocidade idêntica de 1900 quilómetros por hora.»
(David Lodge, A Troca, Asa, 5.ª edição, Maio de 2001, pág. 9; tradução de Helena Cardoso; obra original: Changing Places, 1975)


99. They say when trouble comes close ranks, and so the white people did.
«Dizem que cerremos fileiras quando as dificuldades chegam, e assim fizeram os brancos.»
(Jean Rhys, Vasto Mar de Sargaços, Biblioteca Sábado, Fevereiro de 2009, pág. 7; tradução de José Carlos Costa Marques; obra original: Wide Sargasso Sea, 1966)


100. The cold passed reluctantly from the earth, and the retiring fogs revealed an army stretched out on the hills, resting.

«O frio abandonava o solo com relutância e a névoa que se dissipava revelava um exército espalhado pelas colinas, a descansar.»
(Stephen Crane, A Insígnia Vermelha da Coragem, Nova Vega, 1.ª edição, 2007, pág. 13; tradução de Jorge Pinheiro; obra original: The Red Badge of Courage, 1895)

03 agosto 2006

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Um filme sobre o regresso dos PIXIES.

Trailer:

27 julho 2006

O diário do Padre Fairing

Thomas Pynchon - V.Segundo uma nota de 23 de Novembro de 1934 (relembrar aqui), conclui-se que o Padre Fairing aprendeu a falar com as ratazanas, atribuindo-lhes nomes de santos, constituindo-se como a primeira fase de conversão das ratazanas à fé Católica (pág. 122):

«Ignatius está a revelar-se um estudante difícil. Discutiu hoje comigo a natureza das indulgências. Bartolomeu e Teresa apoiavam-no. Li-lhes um passo do catecismo: “A Igreja, por meio de indulgências, redime o castigo temporal do pecado, aplicando-nos, do seu tesouro espiritual, parte da infinita satisfação de Jesus Cristo e das superabundantes satisfações da Santíssima Virgem e dos santos”.
– E quais são – quis saber Ignatius – essas superabundantes satisfações?
Li de novo: “Aquilo que ganharam durante a vida mas não precisam e que a igreja [sic] aplica aos seus membros na comunhão dos santos.”
– Ah, ah – grasnou Ignatius. – Então, não percebo em que é que isso se distingue do comunismo marxista, que, em sua opinião, é ateu. A cada um segundo as suas necessidades, de cada um segundo as suas capacidades.
Tentei explicar que havia diferentes tipos de comunismo: que a Igreja primitiva, efectivamente, se baseava na caridade comum e na comunhão dos bens. Bartolomeu interveio com a observação de que talvez essa doutrina de tesouro espiritual resultasse das condições económicas e sociais da Igreja na sua infância. Teresa imediatamente acusou Bartolomeu de defender ideias marxistas, e rebentou uma briga terrível, na qual a pobre Teresa ficou sem um olho. Para poupá-la a mais dores, adormeci-a e preparei com os seus restos mortais uma deliciosa refeição, pouco depois das sextas [sic]. Descobri que os rabos, se os deixarmos cozer o tempo suficiente, são bastante agradáveis.»


Thomas Pynchon, V., Editorial Notícias, 1.ª edição, Fevereiro de 2000, 477 pp. [Tradução de Salvato Telles de Menezes] (V., 1963).

23 julho 2006

A teoria e o carro (Capítulo II)

A história que se segue foi-me contada nessa mesma tarde por Henrique. Cumpre-me aqui descrevê-la, se bem que os factos sejam de sua inteira responsabilidade.

Numa manhã de um forte nevoeiro, marcava o relógio trinta minutos após as sete da madrugada, Henrique era acordado por uma forte buzinadela impertinente e insaciável que nem a almofada que colocara em cima da cabeça o fizera insensibilizar perante tão estrídulo concerto. Abriu a janela, preparando-se para vociferar e puxar dos seus galões de delegado do Ministério Público, quando vislumbrou um ser anafado e de faces rubicundas, tingidas de um rosa fúchsia, que assim que a guilhotina se entravou nas patilhas de segurança lhe dirigiu as palavras, ao mesmo tempo que soltava a mão da buzina:
«Henrique Oliveira…?»
Henrique ainda acabrunhado disse: «Sim», disse-o num tom empolado, como que avisando a premente chegada de um estado de cólera, «o que vem a ser esta merda?». E continuou: «Sabe que horas são? Olhe que posso mandar pren…», deteve-se por um súbito avivar da memória. E disse:
«Sr. Procurador…?». O fogo da ira apagou-se de imediato, transformando-se nas cinzas do arrependimento pré submissão.
«Preciso der falar consigo», disse o procurador. «De imediato, se não o incomodar…»
«Pulha», disse para si mesmo Henrique, «sempre com o pau na mão e com o queijo na outra».
«Vou ter consigo ao seu gabinete daqui a trinta minutos», disse o procurador, já de costas voltadas dirigindo-se ao café que acabara de abrir.

Por entre pilhas de processos que decoravam o gabinete numa babilónia de morosidades processuais, Henrique, de café tomado e desperto como um mocho matinal, indaga sobre os propósitos de tão honrosa, inesperada e… confessava-se insuportável visita:
«Sr. Procurador, a que devo a honra de tão ilustre visita?»
«Deixe-se de mesuras, Henrique», atirou logo o Procurador, «que o tempo e o assunto não estão para isso».
«Bem…», pôde dizer Henrique perante a primeira carga de tão idiossincrática ira do Procurador, «faça o favor de avançar, Sr. Procurador!»
«Bom», marcava o Procurador, como que dizendo: «Vê agora se te calas um pouco e me deixas falar». E prosseguiu:
«Os gajos da Judite dão-me cabo da paciência». Era conhecido o ódio de estimação que o procurador guardava em relação a quem, no seu entender, não é das leis mas que se apropria ilicitamente delas.
«Há cerca de um ano foi interceptada uma mensagem de correio electrónico que continha uma pormenorizada descrição sobre um homicídio», disse o Procurador ao mesmo tempo que com um ligeiro esgar, tão característico, impedia Henrique de sequer entoar uma simples interjeição. Este ficou-se pelas súbitas mudanças de expressão facial… era o mínimo.
«A mensagem era supostamente dirigida a uma mulher», disse o Procurador. «Talvez amante do perpetrador do crime. Todavia, tanto a origem como o destino são indecifráveis. Foi utilizado um servidor anónimo situado nas Ilhas Virgens Britânicas, o qual fornecia o alojamento das referidas contas de correio, assim como de plataforma para a sua utilização.»
Henrique mantivera-se calado. Aliás, pensara jocosamente, esquecera-se do guarda-chuva em casa para enfrentar uma possível tempestade salivar se, com as suas interrupções, irritasse o Procurador. Este prosseguiu:
«Sabemos, porém, que o possível assassino é daqui desta terra…» proferiu o Procurador, revelando uma aparente amnésia, «do Marco».
«Felgueiras», corrigiu Henrique.
«Ou isso», disse o Procurador, enrubescendo ainda mais. «Confundo sempre esta salgalhada de terras aqui para cima».
«Bem, como dizia…», disse o Procurador, parecendo perdido.
«Dizia que tem provas que o tal homem era daqui da terra», recordou Henrique. «De FELGUEIRAS!», disse-o sem se furtar a uma ligeira repreensão que, decerto, passaria incólume.
«Pois…», continuou o Procurador. «Portanto, sabemos que ele é de… aqui e que é um proprietário de uma fábrica de calçado».
Assim que o procurador acabou de proferir esta frase, Henrique soltou uma gargalhada que não conseguiu reprimir, e disse, por entre risos e lágrimas:
«Já sei… quem poderá ser… com essa descrição tão pormenorizada…», o sarcasmo foi mais forte que Henrique.
«Como?», atirou o Procurador sem perceber o motivo da gargalhada.
«Ó Sr. Procurador, com essa descrição já conseguimos delimitar o nosso número de suspeitos a… centenas», prosseguia Henrique sem se controlar. «Proprietário de uma fábrica de calçado!? Aqui não há outra coisa…!»
O Procurador num arremetimento de impaciência disse: «Calma! Há mais!»
Henrique pensava em mortes e noutras infelicidades num intento de controlar o riso que parecia irrefreável. Puxou de um lenço, todo amarfanhado, assoou o nariz, limpou as lágrimas, enquanto o Procurador numa fúria incontida despejava o conteúdo da sua pasta na, já de si atafulhada, secretária de Henrique. Por fim, encontrou um papel que ergueu esticando o braço, como um gladiador que empunha o facho antes que se profira a frase «Que os jogos comecem!»
«Está aqui…», disse o Procurador. «Tenho algumas descrições que poderão ajudar».
Henrique manteve-se calado.
«Ora… o nosso homem… humm…», exclamava o procurador enquanto reordenava um maço de folhas desgastadas pelo uso. E prosseguiu:
«Como dizia, o homem tem 45 anos de idade. É branco, bem constituído… físico de desportista, porventura! Tem 1 metro e noventa de altura…» As notas contidas nos papéis – cuja chancela era da Polícia Judiciária – iam sendo ditadas de forma quase aleatória, dada a hilariante balbúrdia que aumentava à medida que mais folhas se iam soltando. O Procurador retomou a descrição:
«Sabemos que esteve emigrado em França e que em tempos praticou andebol… era atleta federado.» Continuou a remexer nos papéis e urrou: «E chama-se José Pintor!»
«Bom!», disse Henrique interrompendo-o. «Já temos alguma coisa… mas, não há nenhum José Pintor residente nesta comarca…»
«Claro, isso já calculava», interrompeu o Procurador. «O nome é certamente falso».
«Sr. Procurador, permita-me uma pergunta…»
«Com certeza», respondeu o Procurador, como se concedesse uma indulgência divina.
«Como é que chegaram a essa descrição tão pormenorizada. Foi a…»
«Judite!», interrompeu o Procurador. «Sabe, o dito cujo e-mail dava muitas pistas que foram investigadas». «Mas», dizia depois o Procurador cerrando o cenho, «aqueles gajos disseram que as provas chegavam a nenhures, e convidaram-me ao arquivamento do caso». «Mas eu hei-de apanhá-lo. Aquele caralho não se verá livre de mim com dá cá aquela palha!», disse-o num tom tão exaltado e num nível decibéis tão acima do legalmente permitido, que a própria secretária de Henrique entrou sem bater à porta acompanhada de um funcionário judicial.
Henrique pediu-lhes que saíssem, porque estava tudo bem. Afinal era o Sr. Procurador que ali se encontrava.
Com o Procurador mais sossegado, Henrique disse:
«Pelas suas descrições, já eliminei uma porção de suspeitos. No entanto, temos um problema…!»
«Qual!?», perguntou o Procurador.
«Há duas pessoas que encaixam como uma luva nesse retrato». E antes que o Procurador falasse, Henrique disse:
«Proponho-lhe o seguinte. Hoje mesmo jantaremos em minha casa com os dois suspeitos. Eu trato dos convites. Topa?»

(continua)