
«Ignatius está a revelar-se um estudante difícil. Discutiu hoje comigo a natureza das indulgências. Bartolomeu e Teresa apoiavam-no. Li-lhes um passo do catecismo: “A Igreja, por meio de indulgências, redime o castigo temporal do pecado, aplicando-nos, do seu tesouro espiritual, parte da infinita satisfação de Jesus Cristo e das superabundantes satisfações da Santíssima Virgem e dos santos”.
– E quais são – quis saber Ignatius – essas superabundantes satisfações?
Li de novo: “Aquilo que ganharam durante a vida mas não precisam e que a igreja [sic] aplica aos seus membros na comunhão dos santos.”
– Ah, ah – grasnou Ignatius. – Então, não percebo em que é que isso se distingue do comunismo marxista, que, em sua opinião, é ateu. A cada um segundo as suas necessidades, de cada um segundo as suas capacidades.
Tentei explicar que havia diferentes tipos de comunismo: que a Igreja primitiva, efectivamente, se baseava na caridade comum e na comunhão dos bens. Bartolomeu interveio com a observação de que talvez essa doutrina de tesouro espiritual resultasse das condições económicas e sociais da Igreja na sua infância. Teresa imediatamente acusou Bartolomeu de defender ideias marxistas, e rebentou uma briga terrível, na qual a pobre Teresa ficou sem um olho. Para poupá-la a mais dores, adormeci-a e preparei com os seus restos mortais uma deliciosa refeição, pouco depois das sextas [sic]. Descobri que os rabos, se os deixarmos cozer o tempo suficiente, são bastante agradáveis.»
Thomas Pynchon, V., Editorial Notícias, 1.ª edição, Fevereiro de 2000, 477 pp. [Tradução de Salvato Telles de Menezes] (V., 1963).
Sem comentários:
Enviar um comentário